Racismo no futebol: uma mancha sangrenta no esporte
Muitas declarações "anti-racistas" são feitas por diversas entidades em todo mundo quando nos deparamos com tais ocorridos em partidas de futebol. Porém, as punições são brandas ou inexistentes. Os casos se repetem com conivência das instituições e partem de um problema profundamente estrutural.
Dois casos recentes levaram essas questões à tona, com jogadores que atuam no Continente Europeu. Nesta quinta-feira (18 de Janeiro), o atacante da Seleção Brasileira e do Real Madrid, Vinícius Jr., foi alvo de ofensas racistas da torcida do rival Atlético de Madrid, antes de uma partida da Copa do Rei. A prevalência do racismo no esporte se mostra cada vez mais comum, com esse sendo apenas um dos inúmeros ataques racistas contra o jogador. Em outro clássico contra esse mesmo time, esse comportamento já havia se repetido antes, com faixas racistas espalhadas pela cidade de Madri e um boneco com sua camisa enforcado num viaduto.
Um caso que foi denunciado por várias organizações internacionais e progressistas, foram cantos racistas e atos horrendos de racismo da torcida do Valência, outro time de futebol que atua na La Liga (primeira divisão do futebol espanhol), os quais ocorreram antes e durante a partida. Milhares de torcedores repetiram o comportamento, com o jogador apontando os racistas e os desafiando. Tal ação resultou em um conflito onde os jogadores do Valencia agrediram o craque, mas apenas Vini Jr, a vítima, foi expulso pela arbitragem espanhola.
Após pressão internacional e nacional, a expulsão foi anulada, três foram presos e o Valência teve que pagar uma multa irrisória de 45 mil euros. As ações foram tomadas de mau grado pelo presidente da La Liga, Javier Tebas, que recriminou o jogador e alegou que ele estava desrespeitando a entidade. Javier Tebas é um apoiador do xenofóbico e ultra-reacionário partido ‘Vox’ e ex-filiado ao partido neofascista ‘Fuerza Nova’.
Outro caso que ganhou atenção internacional foi o caso do goleiro Mike Maignan do Milan, que foi alvo de ofensas racistas vindo da arquibancada. Mesmo com os megafones do estádio da Udinese tentando ‘controlar’ a torcida, eles continuaram, o que levou uma paralização do jogo pela Série A do Campeonato Italiano, Udinese x Milan, com os jogadores do Milan saindo de campo em protesto ao ocorrido. A partida foi retomada após cinco minutos e o goleiro continuou sendo vaiado pelos torcedores da Udinese. Após o fim do jogo, a FIFA, a própria Série A Italiana e diversos jogadores se pronunciaram a favor de Maignan, com o presidente da FIFA propondo uma ‘derrota automática’ para times que a torcida praticassem tais atos.
A Espanha e a Itália são conhecidas pelo envolvimento de fascistas e outros ultra-reacionários xenofóbicos e racistas, com diversos casos ao longo dos anos, como as ofensas racistas contra os jogadores Mario Balotelli e o ídolo brasileiro Roberto Carlos. Porém, no Brasil e na América Latina, casos assim não são nada incomuns. Dois ex-goleiros, Moacyr Barbosa, parte da Seleção da Copa de 1950, foi condenado pela derrota e sofreu diversas ofensas racistas por décadas e o ‘Aranha’, quando atuava pelo Santos, foi alvo de racismo por uma torcedora do Grêmio (que saiu impune na justiça gaúcha).
Contra torcedores, a história é a mesma. Torcedores do Fluminense e do Palmeiras foram alvos de agressões e ataques verbais de cunho racista da Torcida do Boca Juniors durante as partidas pela Copa Libertadores de 2023. Apenas nesse mesmo ano, as duas competições continentais, incluindo a Sulamericana, registrou nove denúncias de racismo, com oito tendo vítimas jogadores e torcedores brasileiros, com a Conmebol, responsável pelas competições, evitando se manifestar sobre alguns casos e apenas oferecendo punições brandas a outros.
Em competições nacionais, podem expulsar para sempre um invasor de campo de frequentar partidas. Jogadores e árbitros acusados por estar envolvidos em esquema de apostas, doping ou manipulações de resultados, podem ser banidos do próprio esporte de forma permanente ou por anos. Porém, para os criminosos racistas, sejam eles na arquibancada ou no campo, as punições variam de multas, ‘notas de repúdio’ ou ‘portões fechados.’ Mas, a reincidência continua sendo comum.
Com um processo de mercantilização cada vez mais avançado, o futebol, esporte das massas, que teve como seu maior ídolo, Pelé, um homem negro e também, diversos outros nomes, como Garrincha, Cafú, Ronaldinho Gaúcho – e no exterior, Eusébio, George Weah, Drogba e atualmente, Kylian Mbappé – marcaram e marcam gerações de jovens atletas e admiradores. O esporte, que foi “criado pelos pobres, roubado pelos ricos” (frase famosa de uma faixa de torcedores antifascistas), possui ao menos 41% dos atletas negros nas suas principais ligas que já sofreram casos de racismo.
Uma ação imediata de combate ao racismo é uma pauta de extrema relevância, seja nas arquibancadas ou fora delas, algo que é prioridade para as diversas organizações de torcedores, antifascistas e progressistas que abertamente condenam e lutam diariamente contra o racismo no mundo do futebol. Porém, as raízes da opressão são sistemáticas, fazendo parte da estrutura do Velho Estado e das diversas instituições privadas, que são coniventes com racismo e apodrecidas de corrupção.
O futebol atual é dirigido por magnatas e isto é algo que as massas rechaçam e compreendem. Elas também valorizam o esporte, com fins além da lógica vendida e colonial, valorizam seus ídolos e entendem o jogo como uma profunda expressão da cultura popular, que enfrenta enormes desafios. A tarefa que cabe a todos nós é rejeitar o velho e construir o novo, acabando de vez com a mancha sangrenta do racismo em toda nossa sociedade, além dos gramados.